Neve ao meio-dia, minhas calotas desmancham diante da furiosa
indiferença com que me objeta. Estou indeciso, não sabendo em que acreditar nas
suas verdades ou nas minhas mentiras Estou sem companhia, a solidão me abraça e
o fracasso me beija os pés. Minhas vigas não sustentam mais nem meu corpo nem
seus sermões. Sou um copo vazio, cacos de vidro, minhas interrogações são
degraus para a mais profana poesia, para a mais neandertal melancolia. Me deixe
em paz, me deixe só, me deixe, vivo, morto, alcoolizado. Não quero mais
brincar, não quero mais saber. Me basta apenas a terra fria, inorgânica,
saborosa. Me basta um fim, um limite. Sou apenas uma estrela sem tela, um
artista sem obra, um barco sem vela, um navegador sem paraíso. Se fosse
Colombo, perdido estaria, pelos mares, pelas torres, pelos bares. Se fosse
Hitler, o nazismo seria apenas livre devaneio. Gutemberg, se meu corpo
habitasse, jamais chegaria à imprensa. Morreríamos sem a explosão de letras que
pariu nossa aldeia global. É muito cedo para morrer, é tarde para sofrer. Me
deixe no chão, mas traga veneno. Uma última taça antes do voo seminal.