Total de visualizações de página

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

A dobra do egoísmo



Amor não se dá, não se vende, não se oferece. O amor simplesmente aparece, é uma conquista, uma doce magia. Amor é algo que se compartilha, que se põe à mesa para duas pessoas. Amor, enfim, é o elo entre duas vidas, é a dobra do egoísmo em favor de algo muito melhor.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Vem comigo


Bora, levanta, sacode a poeira e joga a tristeza ao vento. Bora recomeçar, fazer de novo, fazer melhor. Na vida, não tem game over; na vida, o que tem é o dia seguinte e a oportunidade de se reinventar. Então é assim: diga sim ao que vem ao seu encontro, ao que lhe procura rezando por uma chance. Aquele tempo perdido que foi investido onde não teve nada é só uma lição que deve ficar escrita em letras garrafais em algum diário vazio. Agora não dá mais é para chorar pitangas enquanto o trem passa sem ninguém embarcar. Meu bem, deixa disso; desapega e sossega esse coração aflito. Nada mais é do que já foi. Ninguém é maior do que o próprio reflexo no espelho. Então, não esquenta; relaxa e deixa a banda passar. Tudo vem por um motivo e também se vai por algum outro motivo. Tudo certo, sem problema. O que não pode acontecer é aquele desânimo que pensa que é cunhado e, em vez de ficar dois dias, acaba completando um semestre de permanência indesejada. Não deixa isso acontecer, desaloja esse folgado e volta a viver os seus melhores dias. Eu nunca disse que seria fácil, eu disse sim que sempre foi possível. E ainda é. Mas não vai acontecer com você se acomodando e buscando outros culpados. Deixa de frescura e arregaça as mangas. Chegou a hora de transformar os limões azedos em caipirinha. Você coloca sua doçura e eu a minha loucura. Quando tudo estiver junto e misturado, aí basta servir e ganhar uns trocados. Bora, então ser feliz? Eu chego comigo e você vem sozinha. Juntando nossas companhias, somos uma multidão de alegria. Eu disse, você lembra? Não basta muito para se realizar. Um sorriso, alguns abraços e taí: o mundo voltou a ser colorido e repleto de delícias. Então, partiu ser feliz? Não? Vem comigo, no caminho eu explico, não sem o risco de alguns beijos roubados e o vestido amarrotado.

Felicidade


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Quanto vale a vida?



Rapaz talentoso. Com a bola nos pés, tudo se tornava mágico e óbvio. Os passes precisos e os gols não tão numerosos, mas decisivos; o catapultaram à condição de camisa 10 dos sonhos de qualquer time. A crise financeira e moral que assolou o seu clube à época, o Botafogo, permitiu que rompesse o contrato. Se em General Severiano o salário já era vultuoso, a assinatura de contrato com o São Paulo lhe materializou a fortuna. Com o estrelado, também vieram as brasas da vaidade, consumindo sua carreira e sua imagem. Jogar em um clube tricampeão da Libertadores e do Mundo arrancou sua condição de anônimo. O rapaz agora é atleta de primeira grandeza, pé de obra do escudo mais poderoso do futebol brasileiro. Assim, o assédio explodiu como pólvora ao fogo. As garotas, antes reticentes, agora se tornaram acessíveis. Os amigos, tão sumidos nos tempos menos generosos, se multiplicaram. Tudo parecia roteiro de um filme com final feliz. Mas veio a lesão no joelho, a incômoda fraqueza que o acompanharia até fim dos dias. O joelho ferido foi como um choque de realidade. As oportunidades no time principal do São Paulo encolheram, até sumirem de vez. Para ser aproveitado, foi testado em outros clubes. O jovem envergou as camisas da Ponte Preta, do Coritiba e do São Bento. Nessas paragens, não brilhou intensamente, como o fizera com a camisa gloriosa da Estrela Solitária. Mas, badalado, conheceu muitas pessoas, participou de muitas festas e se tornou alvo de muitos interesses. Na capital paranaense, em especial, conheceu uma moça primaveril e bela. O magnetismo sexual foi intenso e imediato. Passaram a se encontrar com frequência. As famílias foram envolvidas e tudo parecia muito confortável. Quando a carreira lhe tirou do Sul do país, os contatos foram mantidos. Algumas vezes se reencontravam, sempre com a mesma chama e o mesmo ardor. Agora, no entanto, o rapaz já não é aquele menino tão tímido de outra época. A fama e a fortuna o forjaram de autoconfiança. As tantas garotas com quem dorme são expostas em grupos privados de rede sociais como troféus. Ali, desafios e picardias sexuais são numerosos e recorrentes. Sempre há um novo alvo para ser abatido e exibido. Enfim, esse jovem se transforma em um garanhão, em um puro-sangue capaz de tantas proezas no campo da sedução. Nos gramados, já não é tão proativo e seguro. E isso talvez tenha sido a perdição desse promissor atleta. Focado não mais na carreira futebolística, mas em uma vida sexual movimentada; recebe a chance de rever sua querida moça do Sul. Era aniversário dela. Mas, provavelmente, dele seria o maior dos presentes sob os lençóis. Na festa, tudo bem, tudo certo. Bebidas, beijos, fotos, bajulação: o roteiro básico de quem já se afamou sob os holofotes da bola. Quando a celebração parece encerrada, uma proposta de after party. Parecia legal, por que não? E lá foi rapaz para uma casa bastante requintada e afastada do espaço noturno original. Lá, mais bebidas, mais beijos e mais tentações. A mãe da aniversariante, uma senhora de beleza interessante, abandona os festejos para descansar. Nas redes sociais, o rapaz está se gabando com os amigos e promete a eles que apresentará mais uma conquista sexual. De fato, ele se reúne a ela sob lençóis. Mas em quais condições? Teria sido sexo, abuso ou só mesmo uma mera brincadeira pueril de quem queria inflar o próprio ego perante os amigos? Não dá para saber ao certo. As fotos postadas no grupo não são conclusivas. As mensagens textualizadas pelo rapaz sim. Elas dão conta de que, supostamente, ele teve momentos de sexo com a adormecida mulher.  Sem qualquer sobreaviso, o quarto é subitamente invadido. O jogador é dominado por pessoas sedentas de sangue e brutalmente agredido. E ali, entre a chuva de punhos cerrados e solados furiosos, ele vislumbra o começo da carreira, nas categorias de base do Cruzeiro e depois do Botafogo. Ele relembra os gols, os títulos, as amizades e todo o desfiar de sua carreira que parecia tão futurosa e destinada ao estrelato. Se pudesse imaginar como seria o próprio fim, jamais preveria que seria daquele jeito: sendo desfigurado por agressores irascíveis, em meio ao olhar assustado de cúmplices acovardados, no esplendor da sua jovialidade. Não demora até que tudo se torne turvo e opaco. A Divindade, do alto de sua misericórdia, arranca o jovem de seu corpo mutilado, antes que ali lhe fossem produzidos os ferimentos mortais e sádicos. Do lado de fora, ele consegue se ver já sem vida e completamente  destruído. Bem diferente das fotos de jornais, sites e revistas. Bem diferente do sorriso que lhe estampava a face quando em companhia de familiares e entes queridos. Aliás, mesmo distante deles, consegue captar cada angústia e cada dor, até que a verdade se revela e a todos choca. Sem poder amparar aos que ama, o rapaz reflete. Terá mesmo valido a pena morrer por tão pouco? Para onde estamos caminhando, se a tecnologia, em vez de auxiliar, se transforma em instrumento de narcisismo e desinformação? Uma carreira tão abençoada deveria mesmo ter conduzido àquilo? Será mesmo que as mulheres supérfluas e os amigos de aparência foram a melhor escolha? Quantas amizades genuínas e amores cristalinos se perderam por entre as sombras do egocentrismo e da soberba? Quanto vale a vida? Tão pouco a ponto de seres humanos subtraírem a vida de outro por ciúme e vingança? Uma vida é descartável a ponto de ser destruída de forma tão psicótica e doentia por mera frivolidade? Onde estavam aqueles que prometeram lhe acompanhar até o final? Onde estavam os amigos que honrariam sua memória e sua história? As tantas reflexões foram interrompidas quando mãos radiantes tocaram o ombro do rapaz. Ali sim estavam seus amigos de verdade, aqueles que vieram lhe trazer consolação e reconstrução. Então, à luz da sabedoria, o jovem entendeu que ali se formava uma nova chance de recomeçar, que ali estavam não as trevas e o ostracismo, mas sim a esperança e o renascimento, permitindo-lhe converter todos os descaminhos em acertos, todos os medos em convicções para um novo ser e uma nova era.

Nota: Esse texto é uma reflexão e uma homenagem à memória do atleta de futebol Daniel Corrêa Freitas, brutalmente assassinado. Que sua trajetória nos sirva de lição e de ponderação sobre os tempos em que vivemos hoje, de muita intolerância e de desrespeito a valores basilares como amor, empatia, amizade e solidariedade.