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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Nosso show


Te pego na escola e saímos pra dar uma volta. Compramos um livro, tomamos sorvete. Provoco seus olhos e pego suas mãos. Molho teus lábios, encho tua bola com todo meu amor.
A noite promete. Baile legal, gente bacana. Te levo pra festa, a gente curti, a gente bebe e a gente dança. Te arrasto pro quarto e lá testo teu sexo com ar de professor.
Te vejo mil vezes em um segundo. Não pisco, acordo sem ter dormido. Não resisto. Te faço promessas malucas tão curtas quanto um sonho bom.
Encontro uma amiga, a gente sai e se diverte. É muito gostoso, mas bem diferente. Não é com você, não é tudo aquilo. Se te escondo a verdade, baby, é pra te proteger da solidão. Escrevo poemas, canto sozinho, saio escondido. Faz parte do meu show, meu amor.
Perdido no teu quarto, no edredom dos meus sentimentos, confundo as tuas coxas com as de outras moças, te mostro toda a dor.
Não uso camisinha, não esquento a cabeça. Te faço um filho, você se desdobra entre livros e fraldas. Te dou outra vida, uma mais bonita, pra te mostrar quem sou.
Vago na lua deserta, entre planetas e naves, entre sonhos e amores. Das pedras do Arpoador faço ruínas e reconstruo um coração.
Digo alô ao inimigo e pago a ligação. Encontro um abrigo, depois das pontes e palácios, no peito do meu traidor. Faz parte do meu show, meu amor.
Invento desculpas, nossa vida é uma rachadura. Provoco uma briga, convoco uma amiga da solidão. Digo que não estou, pra dizer que não tem show. Vivo num clip sem nexo, MTV sem sexo, pátria sem progresso, meu pierrot retrocesso, uma bossa nova no meio do meu rock´n roll. Faz parte do meu show, meu amor.



segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Feliz diferença



Penso em ser feliz
Não sei se somos felizes
Tenho certeza de que temos alegrias
Felicidade, não sei

Não sei porque felicidade é construção
É poesia de muitas mãos e vozes
Ser feliz é sonhar com dias melhores
E trabalhar arduamente nos ruins
É esperar e ir ao encontro
É desistir sem largar mão

Quem é feliz de fato na vida?
Ter algum amor ou a quem amar ajuda
Ter planos e sonhos contribui
Mas a fórmula da felicidade está em si
Está em fazer mais e melhor
Fazer como se fosse a última vez
Fazer porque gosta e também porque é preciso

Feliz é quem faz, pois aprende que sucesso não vem antes do trabalho
Aprende que o feliz labuta até chegar ao resultado
Resultado que vai muito além do oceano de estatísticas
Ser feliz é entender quando um ato ou uma presença
Por mais simples e ligeira que seja
Faz toda a diferença.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Beijos perdidos


O beijo é um ato tão antigo quanto a humanidade (óbvia constatação, não é??). Beijos já selaram amores e decretaram traições mundo afora. Beijos marcam nossas vidas e muitos momentos se tornam especiais por conta deles.
Porém, vivemos uma época de gratuidade, onde amores e valores significam muito pouco. Digo isso porque, em tempos mais remotos, um beijo simbolizava amor, união, cumplicidade e paixão. Hoje, ele tem se mostrado muito mais protocolar e banal do que qualquer outra coisa. Beija-se muito na atualidade, mas há muito pouco de envolvimento e sinceridade no gesto. É normal em uma mesma noite que se beije dezenas de pessoas diferentes (algo que considero um verdadeiro suruba labial). A questão é: quantos beijos realmente valeram a pena e demonstraram que havia de fato a intenção de um envolvimento sexual e afetivo?
Eu não tenho a resposta, mas imagino que muitos desses beijos de noitada nada mais são do que um modismo, uma forma de se dizer descolado e moderninho. Eu sinto um pouco de pena por essa geração beijoqueira e fugaz. Beijo é uma expressão, é um ato que utilizamos para transmitir uma mensagem. Abrir mão disso é tirar todo sabor que essa ação proporciona. E, desfazendo qualquer interpretação moralista do que eu digo, não defendo que um beijo seja um poema, um ente amoroso. Não. Beijo pode ser tesão, pode ser uma forma de se dizer a outra pessoa que alguém quer ir para cama. Beijo pode ser um convite ao sexo ou uma rendição à beleza alheia. Esse beijo é super válido. Condeno, de fato, é o beijo que não diz, o beijo que se dá sem desejo, sem sentimento, sem nada. O beijo que fica só na estatística do “quanta(o)s eu peguei ontem”.
Faço, de todo o coração, o desafio para que cada um pense sobre o beijo e seus desdobramentos. Não se trata de evitar ou economizar no ato, mas sim de fazê-lo por livre e espontânea vontade, sem pressão de amigo(a)s sem noção ou de cálculos toscos. Fazer do beijo uma tradução de suas preferências e de seus estilos, transformar um encontro de lábios em um encontro de pessoas, é esse o convite que faço. Beijem, mas beijem pela causa e não pelo efeito. Posso garantir que há muitas surpresas e delícias escondidas sob o véu de um beijo sincero e apoteótico. Experimentem, descubram, permitam-se.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Para sempre Carol


Foi difícil esquecer aquela cena. O fogo, o desespero, o sangue sublinhando o horror estampado nos olhos. Carolina estava morta. Eu olhava e não acreditava. Não podia ser real, não podia estar acontecendo. Pessoas me arrancaram do carro só porque em algum momento eu desmaiei.
Acordar horas depois só trouxe frações de alívio porque quis negar o real, acreditar que era só um pesadelo. Porém, o pesadelo estava vivo e Carol, morta. Chorei lágrimas de sangue e minha recuperação foi lenta. Tão lenta e arrastada quanto a minha vontade continuar vivendo. Tudo se misturava: dor, fúria, amor, paixão, culpa, ressentimento, saudade, revolta... Meus pensamentos estavam mergulhados em um liquidificador que não me deixava reunir os cacos.
Pensei no fim, em encurtar minha existência. Faltou coragem ou talvez tenha batido medo de não existir mais nada além da vida. Não importa. Decidi continuar respirando meu sofrimento.
A paz só me vinha nos sonhos, quando Carol me visitava, dizendo estar bem, dizendo para eu não me torturar ainda mais. Ela alisava meus cabelos com uma das mãos e se deitava comigo. Era aquela vida a única a fazer sentido.
Tomei vidros e vidros de narcóticos. Só queria repousar. Talvez Carol não quisesse me deixar ir. Talvez ela tivesse os mesmos medos. Talvez ela só estivesse viva na condição de eu também estar. Com um beijo nas mãos, eu a deixei e acordei um pouco melhor.
Retomei pedaços de pedaços do meu cotidiano. Resgatei alguns amigos e alguns prazeres. Dormi cada vez menos e as visitas dela escassearam. Descobri uma nova pessoa. Não uma substituta, mas uma parceira. Compartilhei meu carma e, em retorno, obtive algumas confissões inéditas. Cruzamos linhas e aproximamos nossos corações.
Havia uma esperança no futuro. Havia muito mais de Carol em mim do que eu supunha. Absorvi dela muito mais do que esperava. Carol e eu estamos juntos para sempre. Em todas as vidas e em todas as formas de existência. Carol sempre será minha tatuagem, minha liberdade prisioneira.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Baixa paixão


Com o baixo no colo, ele disparou alguns acordes e moveu a cabeça bem lentamente, extasiado pela música que ouvia mais em seus pensamentos do que em seu quarto. Suzana apenas olhou um tanto entediada, pois já havia assistido àquela cena exaustivamente. Era como estar em um show de mágica pela enésima vez consecutiva.

- Bem, vamos sair deste quarto. Lá fora tem muita coisa legal rolando.

Ele a olhou com um rancor que parecia moldar uma máscara pavorosa em seu rosto. Se fosse um cão, rosnaria como se alguém tentasse tirar-lhe a comida.

- Sabe que você é muito mal humorado para quem se diz músico? Além disso, faz tanto tempo que isso não te dá dinheiro. Nunca pensou em deixar de lado, tentar outra coisa?

Aquelas palavras torturavam o coração do rapaz. A música em sua vida era uma combinação de furiosa paixão e prazer. Tocava aquele instrumento como quem toma a amada nos braços e a traz para um valsar emoldurado por uma noite de lua cintilante e refrescado orvalho. Era algo de imenso bucolismo, uma preciosidade que jamais deveria ser profanada por palavras tão cruas.

- Suzana, - disse ele passando a mão pelo rosto como quem procura o fiapo de uma já inexistente paciência - é mais fácil largar você do que a minha arte. Então, cuidado com o que deseja. Quanto ao mundo lá fora, eu posso dizer que estou bem aqui. Se quiser ir, vá. A porta não tá trancada.  

A namorada rebaixou o olhar. Era difícil entrar na concha do rapaz. Ele se fechava ainda mais com o acúmulo de fracassos e frustrações. Parecia ter pedras e paus nas mãos para cada crítica realista ou construtiva.

- É difícil desse jeito, sabia? Você sempre vem com tudo quando a gente tenta dizer alguma coisa. A vida é complicada, mas tem que enfrentar. Não dá pra ficar o tempo todo na defensiva, como se tudo estivesse bem lá fora.

- Esse é o seu problema. Você esquenta demais a cabeça com o “lá fora”. Com a mão pousada sobre o peito, concluiu: - O que se passa aqui dentro é muito mais importante. A nossa vida se resolve é desse lado.

Exasperada, ela rebateu: - A vida se resolve é de todos os lados. Você acha que vai conseguir ficar pra sempre na sua bolha de indiferença? Acorda, tá? Não dá pra ficar pra sempre abraçado com esse violãozinho.

Foi preciso que o rapaz contasse até 20 para não explodir em um arroubo de impropérios e ofensas: - Não é violãozinho, é um baixo. E não é um baixo qualquer. O nome dele é Kevin e é assim que você deve chamar. Eu não chamo o seu vira-lata de cachorro, eu chamo pelo nome que você deu a ele.

Suzana não aguentou: - Vai tomar no cu, seu filho da puta adolescente. Você não pode comparar o Steve, que é um ser vivo, com uma porcaria de instrumento. Essa merda você pode quebrar, jogar fora e pegar um novo depois. Quer saber? Vê se cresce, Peter Pan. Quando fizer 18 anos, aí você me liga de novo, tá? Em seguida, ela saiu acompanhada de uma violenta batida de porta.

O rapaz balançou a cabeça de maneira negativa e voltou-se ao baixo, apertando o instrumento contra o peito ainda mais forte. Os olhos se fecharam por completo e os dedos deslizaram pelas cordas, fazendo nascer um som gutural e arraigado. Era como um grito que une voz e melodia de uma maneira que só a genialidade da emoção é capaz produzir.