Foi difícil esquecer aquela cena. O fogo, o
desespero, o sangue sublinhando o horror estampado nos olhos. Carolina estava
morta. Eu olhava e não acreditava. Não podia ser real, não podia estar
acontecendo. Pessoas me arrancaram do carro só porque em algum momento eu
desmaiei.
Acordar horas depois só trouxe frações de alívio
porque quis negar o real, acreditar que era só um pesadelo. Porém, o pesadelo
estava vivo e Carol, morta. Chorei lágrimas de sangue e minha recuperação foi
lenta. Tão lenta e arrastada quanto a minha vontade continuar vivendo. Tudo se
misturava: dor, fúria, amor, paixão, culpa, ressentimento, saudade, revolta...
Meus pensamentos estavam mergulhados em um liquidificador que não me deixava
reunir os cacos.
Pensei no fim, em encurtar minha existência. Faltou
coragem ou talvez tenha batido medo de não existir mais nada além da vida. Não
importa. Decidi continuar respirando meu sofrimento.
A paz só me vinha nos sonhos, quando Carol me
visitava, dizendo estar bem, dizendo para eu não me torturar ainda mais. Ela
alisava meus cabelos com uma das mãos e se deitava comigo. Era aquela vida a
única a fazer sentido.
Tomei vidros e vidros de narcóticos. Só queria
repousar. Talvez Carol não quisesse me deixar ir. Talvez ela tivesse os mesmos
medos. Talvez ela só estivesse viva na condição de eu também estar. Com um
beijo nas mãos, eu a deixei e acordei um pouco melhor.
Retomei pedaços de pedaços do meu cotidiano.
Resgatei alguns amigos e alguns prazeres. Dormi cada vez menos e as visitas
dela escassearam. Descobri uma nova pessoa. Não uma substituta, mas uma
parceira. Compartilhei meu carma e, em retorno, obtive algumas confissões
inéditas. Cruzamos linhas e aproximamos nossos corações.
Havia uma esperança no futuro. Havia muito mais de
Carol em mim do que eu supunha. Absorvi dela muito mais do que esperava. Carol
e eu estamos juntos para sempre. Em todas as vidas e em todas as formas de
existência. Carol sempre será minha tatuagem, minha liberdade prisioneira.
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