A sensação é de que houve um apocalipse. Só vejo ruas
destruídas, prédios desmoronados e corações despedaçados. Como quem não entende
onde se meteu, me pego com as mãos ensanguentadas e com a poeira cobrindo meu
rosto. São os sinais de culpa, de autoria criminal. Mesmo sem compreender, fiz
parte de todo esse processo destrutivo, de toda essa corrupção emocional. Fui inconsequente,
deixei o arroubo de um momento transformar toda minha obra em ruínas
existenciais. Tudo por que lutei exterminado por meus próprios dedos, como se
eu fosse um louco que rasga dinheiro e quebra cristais. No reflexo de um
espelho, só vejo vergonha e vazio, sentimentos esses que nem de longe me
acompanhavam em outras eras do meu passado. Talvez eu seja apenas o esboço, o
rascunho mal feito de algo de que tanto me orgulhava. Agora, me sobram os
restos e as raspas, os pedaços desmembrados daquilo que foi outrora tão límpido
e invejável. As lágrimas não mais adiantam, o arrependimento não mais comove.
Apenas revelam a tristeza por trás de quem escolheu a autossabotagem como
destino de seus próprios desatinos. É a hora de se levantar e de começar a
reconstrução, isso não sem antes colher as lições da amargura e os aprendizados
do descaminho. O recomeço vem do reconhecimento do erro, do reexame de tudo que
foi sacrificado. Não é possível marchar para frente sem observar a rastro de
enxofre que ficou no horizonte. Para acertar, é preciso antes parar de errar.
Tão fácil na teoria e tão dificultoso na prática do dia real. Mas que assim
seja então: um acerto por turno, um infortúnio que não se completa. É desse
modo, peça por peça, que grandes feitos são erigidos. Vamos, então, começar e
não mais tardar. A vida segue, seja como pesadelo recordado, seja como jornada
de trabalho aproveitado. A escolha é de cada um.
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