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quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

O homem além da curva


Ele nasceu em um mundo redondo, da barriga encurvada de uma mãe zelosa. Foi amamentado pelos seios espiralados de um amor eternal. Cresceu vendo que a vida é cíclica, retornando ao começo para uma nova tentativa. Ele entendeu que a dialética não é papo furado de livros sobre filosofia. Ele se encantava com as praias cariocas, com os corpos sensuais das garotas de biquíni e com as ondas girando em direção à areia. Ele estudou e fez amigos. Percebeu que as relações humanas não caminham em linhas, mas em curvas e desvios complexos e ricos. Ele enfrentou o status quo porque não aceitou que ideias devam ser impostas por tanques e armas como um horizonte plano que desaba sobre nossas cabeças. Ele viajou, conheceu o mundo e percebeu que não existe fim de linha, mas apenas o reinício de uma volta. Ele transpôs as belezas sinuosas para sua arte, transformou um ofício de funcionalidade em uma ode à criação e à produção. De fato, ele fez algo novo, inédito, revolucionário. Viveu para colher os frutos de seu engenho, inspirou uma geração de sonhadores e profetas. Desafiou a vida e driblou por muitas vezes o esquife. E tinha razão para tal. Sempre era possível aprender e assimilar algo engrandecedor com essa mente extraordinária. Incrivelmente, seu corpo envelhecia, mas a maestria de sua psique se renovava infinitamente. Até a virgindade de um guardanapo se via ameaçada quando caía nas mãos desse gênio indomável. Pronto, jaz um pedaço de papel para o nascimento de mais um projeto mágico. Até na despedida, tudo é diferente. É difícil chorar porque ele vai com o dever de casa rabiscado, assinado e aprovado. Na verdade, a hora é de reverência, é de nos curvarmos em respeito e admiração a quem reinventou a vida, entortou a morte e, agora, se prepara para um novo trabalho em um lugar que realmente há de merecer toda a argúcia de seus planos e traços. 


Não é o ângulo reto que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein
Oscar Niemeyer

Um comentário:

  1. Perfeito. Dá pra adivinhar que eh sobre Niemeyer mesmo se não estivesse tão em voga a morte dele. Adorei a sinuosidade que você mostra no texto, que também faz parte da nossa vida... E ainda mais a maneira como você escreveu.

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