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quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

A Terra e a Vida



A Terra não é plana. A Vida também não é. Então seriam elas redondas? Prefiro dizer que são profundamente dialéticas. E isso, por si só, já nos impulsiona, nos pressiona e nos transforma. Vale de incentivo para quem está por baixo, desolado, excluído. Isso porque, de giro em giro, a Terra e a Vida podem levar os perdidos a um outro patamar. É a prateleira dos vencedores, dos gloriosos, daqueles que alcançaram o triunfo. Mas isso não vem de graça. É preciso se mobilizar, se esforçar, correr atrás. O mesmo se diz para quem está no privilégio. Por essas voltas e revoltas da existência planetária, o seu lugar também pode mudar. O topo da pirâmide pode não ser um lugar para sempre. Inércia e soberba abalam de morte o todo conquistado; os privilegiados de antes podem se tornar os futuros esquecidos. Antes, o que era luz e flash pode ser em pouco tempo apenas penumbra e frio. É assim que funciona. A Vida e Terra são uma gigante gangorra. Elas viram e reviram certezas, verdades e crenças. Entre a tese e síntese, passando pela antítese, muito pode acontecer e tudo vai mudar. Podem ter convicção disso. Mesmo sem as provas. E, no fim, o que era para ser lavado, se tornou vazado; o que era para ser o certo, se tornou o errado. Hegel não era apenas um filósofo, ele era, muito antes disso, um profeta, um apóstolo. O que ele escreveu foi a mais universal das leis. “Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”, é um lindo verso que parafraseia versículos dialéticos. E fica a lição: a Terra não é plana e a Vida não é quadrada, mesmo mudando para algo que não é mais como antes, elas se tornam figuras geométricas de alguns ângulos cada vez menos retos. Ainda sobre elas, muito vale o que nos ensinou muito sabiamente Tales de Mileto: “todas as coisas, incluso as inanimadas, estão cheias de vida”. A realidade respira e o trem volta para a estação, mas diferente, porque diferentes são os passageiros de cada viagem. “É pau, é a pedra, é o fim do caminho. É um resto de toco, é um pouco sozinho. É um caco de vidro, é a vida, é o sol. É uma noite, é a morte, é um laço, é o anzol.” É tudo e nada, passando pelo todo. Sim. Tom Jobim foi mais um dialético, mais um maluco das incertezas cilíndricas e das letras orbiculares. Talvez ele já saiba o quanto estamos fodidos. Mas que pelo menos saibamos que em tudo há Vida e que tudo volta, primeiro como tragédia e depois como farsa. Ou seja, não há zona de conforto nem mesmo para quem se acha acima do bem e do mal, além do corpo achatadamente celestial. É a Vida que nos ensina que a Terra pode até ser muito mais complexa do que surfistas caindo no abismo do horizonte, do que plantações de maconha em câmpus universitários ou do que canções dos Beatles doutrinando novos comunistas.



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