Assim começa o dia. Você acorda, abre os
olhos e se vê perdido, completamente fudido. Nada mais faz sentido, todos os
seus erros se somam, se avolumam, tornando-se um espantalho espelhado de todos
os seus erros. E, do nada, tudo se torna pânico, se torna pesadelo. Esse é o
processo de culpa. Ele brota aos poucos do seu inconsciente, mas explode de
súbito, como um vulcão aceso. Aí, as lágrimas se misturam ao desespero, formando
um painel torturante e dantesco. Então, por onde começar, como agir? Eu,
francamente, não sei responder, porque a mente é individualmente complexa e
confusa. Sei que é preciso aceitar os erros, assumir as responsabilidades e
depois fazer o caminho de volta de tudo aquilo que erroneamente provocamos. É
preciso mesmo processar a catarse, depurar o coração e, por fim, pedir perdão a
quem seja for. Depois, enfim, haverá um pouco de paz de espírito, de ondas de
calmaria. Aí, sim, será o tempo de reparação e de reconstrução, de recomeço e
de redenção. Mas isso tudo só é válido se vier sublinhado de sincero
arrependimento e de um novo modelo de comportamento. Quem repete os próprios
erros não se arrependeu e muito menos aprendeu. É o mesmo roedor que ainda cai
na mesma armadilha emocional de sempre. O novo agir é que leva à liberdade
condicional, onde, sob supervisão de nós mesmos, vamos dando passos de nenê, um
de cada vez, em busca de nova forma de interagir e de refazer tudo aquilo pelo
qual sonhamos. Vencida a condicional, aí sim estaremos prontos para voos mais corajosos,
para relações mais produtivas, em que estaremos de peito aberto para aceitar
sofrer pelo outro sem a ele provocar nenhum dano. Aí, nessa zona de perigo,
entendemos o que nos diz Cristo, quando sugeriu oferecer a outra face em
resposta à agressão sofrida. Sofrimento se paga com tolerância e com compreensão.
Nesse estágio da nossa evolução sentimental, estaremos preparados para, de fato,
amar sem causar dor, para amar sem pedir provas de correspondência afetiva,
para amar, enfim, sem olhar para trás, sem questionar o amado, crendo-lhe e
confiando em sua capacidade de se crescer junto, de amar também em um exercício
em que o coletivo suplante, e por muito, nosso senso de existência individual.
Amar é, no fechamento de todas as reflexões, um gesto pluralista e
empreendedor. Quem ama sempre estará cercado, sempre será o elo mais forte que
forma uma corrente muito maior e muito mais envolvente do que podemos,
egoistamente, ponderar. Amar é estar em um todo formado por tantos que jamais
seremos capazes de separadamente contabilizar.
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