Estou lendo um livro chamado 1968, o ano que não terminou, do
inspirado Zuenir Ventura. Obra muito rica em detalhes que descreve a
efervescência do movimento estudantil durante o preâmbulo da ditadura
(propriamente dita) militar no Brasil. Como a História nos ensina e o mesmo
livro revela, os anos passaram e o regime de controle absoluto da sociedade
endureceu, com prisões, sessões de torturas e assassinatos.
Esse momento histórico, é
importantíssimo ressaltar aqui, contou com amplo apoio de grandes veículos de
comunicação e de formadores de opinião que ainda são citados hoje como respeitáveis
(não perderei tempo com citações para não ferir o orgulho dos mais sensíveis,
mas, para quem quiser aprofundar no assunto, a internet e as bibliotecas estão
à disposição).
Com a redemocratização no final dos
anos 80, o país voltou a ter o direito de escolher seus representantes e a
usufruir de liberdade de expressão. A juventude pôde pintar os rostos e ir às
ruas gritar pela saída do presidente Fernando Collor (segundo dizem, exitoso no
pleito eleitoral por realizar trabalhos de magia negra, mas, na humilde opinião
de quem escreve este texto, essa magia negra atende pelo nome de Organizações
Globo).
Com o avanço das décadas e por motivos
que vão além do que meu olhar crítico pode alcançar, os jovens perderam o
fôlego e o interesse por reivindicar seus interesses. O olhar atento à
realidade e aos rumos do meio em que vivem foi trocado pela alienação. A
juventude de hoje é movida a ídolos imediatos e a relações-relâmpago, que são
logo desintegradas para que haja uma nova. É assim, tudo muito rápido,
cibernético e superficial, a infinitude desfrutada em um instante.
Para minha surpresa, na última sexta,
dia 20, deparo-me com uma mobilização de jovens e estudantes contra o aumento
da passagem de ônibus. Com muita disposição, fecharam, de forma alternada, as
duas margens da Avenida Rio Branco, tornando o trânsito de um começo de noite
ainda mais insuportável do que já é. Motoristas xingavam e desejavam os
infernos para aqueles “jovens desocupados”, mas eles seguiam em frente,
convidando todos ao debate e à análise daquela decisão política do prefeito,
que, por motivos que não cabem aqui levantar, atende tão prontamente aos
interesses dos empresários que controlam o transporte público em Juiz de
Fora.
Confesso que fiquei com muita vontade
de aderir, de entrar no meio daquela batalha para discutir e trazer à tona as
maneiras como o processo público e político é resolvido na minha cidade. Não fui, entre outras razões, porque tinha em
mãos um frágil computador portátil que não era meu. Porém, fiquei observando
atentamente, hipotecando de forma silenciosa meu apoio ao que ali se
desenvolvia. Os motoristas furiosos precisam entender que o incômodo e a
provocação são os grandes escavadores dos questionamentos e da crítica. Devemos
sentir desconforto para perceber que algo está errado e que precisa ser
avaliado. Com esse intento, os estudantes foram a público e deram seu recado.
Cabe a nós, agora, analisar friamente
e ver o quão certos ou errados eles podem estar. A eleição, é bom lembrar, se
aproxima e tudo o que foi feito durante os últimos quatro vai entrar em jogo
para uma profunda checagem. Será mesmo que valeu a pena apostar no mesmo para
encontrar uma solução nova? Isso deve ser pensado por todos nós.
Não posso terminar o texto sem apontar
outro fator interessantíssimo que observei quando os jovens se mobilizaram na
noite de sexta: o contraste. Quando eles irromperam a Rio Branco com apitos,
cartazes e muita atitude, o Parque Halfeld era palco (havia realmente um palco
instalado lá) de uma apresentação musical muito bacana da banda Zé do Black. No exato momento, eu estava
ali, defronte para os músicos, curtindo o show e, de repente, me deparo com o
barulho dos “rebeldes” (pelo amor de Deus, estou falando de rebeldia, não de
novelinha adolescente meia boca; se for esse seu caso, só posso dizer que você
está no blog errado). Na mesma hora me veio na cabeça a letra de A novidade, dos Paralamas do Sucesso com
o Gilberto Gil, sublinhando aquela dúvida que pairou sobre todos ali presentes:
continuar de olho no show ou voltar às atenções para o protesto dos garotos?
Ainda sob interrogação, escutei mais
duas músicas e depois ouvi de um rapaz, de Santos Dumont, que achava protestos
chatos e que estava bom para ele qualquer decisão tomada pelos políticos. Na
mesma hora, me despedi dele e parti para perto do protesto, observando e
tomando partido na luta por mudanças contra aquilo que se julga errado.
É estranho, pois, mesmo sendo
professor, reaprendi com um desconhecido que nunca se deve deixar para os
políticos as definições que queremos para nós, nunca devemos deixar para os
outros a decisão que afetará nossas vidas. Se podemos falar, então que nossa
voz seja escutada e que incomode até a rouquidão nos alcançar. Muitos no
passado deram seu sangue para que isso fosse realidade, não desperdicemos,
então, esse sagrado vermelho que foi cruelmente profanado por corruptos e
torturadores.
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